sexta-feira, 22 de março de 2013

Quem tem medo de Sócrates?


Para mim foi dos melhores dois ou três primeiros-ministros da nossa democracia.
Corajoso a incomodar interesses corporativos instalados, como ninguém o tinha feito antes: professores, magistraturas, médicos, indústria farmacêutica...
Voluntarioso e perspicaz na persecução das reformas necessárias no ensino, na saúde, na segurança social…
Por isso, ninguém como ele foi tão longamente perseguido nas instâncias judiciais, no julgamento de caráter na praça pública, mesmo com intromissões inaceitáveis na sua vida privada.
Foi cilindrado pelo impacto que teve a crise financeira mais grave depois dos anos vinte nas dívidas soberanas. Crise que agora já se aceita ter igualmente atingido a Irlanda, Grécia, Espanha, Itália… mas entre nós a culpa era dele e apenas dele.
Caiu em consequência dos resultados eleitorais. E afastou-se.
Mas continuou a ser o alvo preferido para bombo da festa de alguns, fosse porque vivesse num pretenso luxo parisiense, fosse porque tivesse aceitado uma oferta de trabalho. Porque a ele nada se poderia permitir, salvo ser o objeto das calúnias de sempre, do preconceito ignorante e atrevido.
Mas isso era pouco. Quem sempre foi objeto das mais negras e caluniosas campanhas deveria aceitar ouvir e calar. Falar não, menos ainda defender-se.
E isto diz bem de certa gente para quem bastaria um cheirinho à pólvora do antigamente para calar, no mínimo calar, um adversário político. Porque esta é a mesma mentalidade dos responsáveis por uma longa ditadura.
Finalmente:
Todos têm direito a pensar de modo bem diferente de Sócrates e não é isso que está em causa. O que questiona é a mordaça pretendida. O que questiono é que, para justificar tal mordaça, se insista naquilo que designo por conversa de taxista ou de salão de cabeleireiro: retomar a acusação de prática de crimes a que os tribunais não deram seguimento, estando os longos, muito longos, processos encerrados, sem recursos pendentes. Porque isso já não é opinião. É a acusação da prática de crimes por quem se julga juiz encartado pelo preconceito e pelo atrevimento canalhas próprios.
Com algumas pessoas estou habituado a coisas destas pois sempre misturaram as coisas – a opinião e o facto - do alto da sua saloia pedantice. Outros surpreendem-me, e muito, por esperar mais deles.