sábado, 8 de fevereiro de 2014

Ainda as praxes


“Há pouco mais de 40 anos, no final dos anos 60 do século passado, as palavras-chave de um relatório da Unesco sobre a juventude eram estas: contestação, transgressão, contra-cultura,  contra-poder, cultura dos jovens. Hoje, já nem é preciso relatórios para conhecermos as palavras que descrevem a situação dos jovens: desemprego, precaridade, pragmatismo, sobrevivência. Da época em que a juventude teve uma grandiosa significação cultural e quis assumir a responsabilidade do devir histórico, com o entusiasmo político de quem se sentida um grupo messiânico, chamado a libertar a humanidade da opressão e da injustiça, passámos para a época em que ser jovem significa ausência de projecto, aceitação dos limites, repetição. Do grande espaço público, a juventude passou para a estrita cena privada. A ideia de juventude desligou-se, aliás, de uma ideia cultural e ficou vinculada apenas a lógicas de consumo, de trabalho , e a modos de ocupação do tempo. As famigeradas praxes não são mais do que uma forma de querer recuperar, pelo lado grotesco e alarve, uma coisa que já não existe nem tem condições para existir: a comunidade a que a vida dos estudantes dava forma, dotada de um grande significado cultural e intelectual. Elas exercem-se, portanto, no mais completo vazio, e por isso é que são violentas e patéticas. A herança do nosso tempo é a do acaso dessa invenção recente: a juventude enquanto categoria da descrição e análise sociológicas e agente de uma cultura. (…)”
António Guerreiro, PÚBLICO / ípsilon de 31-01-2014

1 comentário:

Majo disse...

Uma boa análise, muito bem exposta.

Uma outra excelente dissertação:

http://obloguedasantagonices.blogspot.pt/2014/01/dos-abusos-dos-abusados-e-dos-abusadores.html

Com simpatia.