Até então, não tinha ido além de Ayamonte, ida e volta no
mesmo dia. Era o tempo as férias em Pêra e do pirex em Espanha. As irmãs Lima
iam ao pirex, eu e o Asdrúbal seria o que fosse. Desse tempo perdurou durante
anos, como decoração do meu quarto, uma raquete de ténis, de liga de alumínio,
e ainda tenho o D Quixote e Sancho Pança em madeira. Claro que isto com a ajuda
de uma cunha na PIDE de Portimão, pois sem papelinho nada feito para quem
estava em idade de cumprir serviço militar e se podia pirar.
Também até então, dormidas fora de casa ficavam-se pelos
acampamentos na Serra da Estrela, na Lagoa de Albufeira, no parque de campismo
de Escaroupim, no quintal do Lelo…
Desta vez fazia a minha estreia de avião a caminho de um hotel
em Zurique, com o pretexto de um estágio profissional na mais importante
resseguradora suíça. Tirei o passaporte, comprei um fato de bombazine bege, uma
pasta nova, uma mala para o porão. E tudo corria bem até ao controlo de
entradas do aeroporto de Zurique. Passaporte em ordem, mas o bilhete da viagem
só compreendia a ida e não o regresso.
De nada serviu jurar que ia fazer um estágio de 15 dias, que
depois entraria de férias com saída em direção a Dijon, podendo acontecer que
me viessem buscar e que, a não ser assim, sairia de Zurique por comboio. Porque
era mesmo assim que as coisas estavam definidas: sair para Dijon, depois Nice e
a seguir Roterdão. Uma coisa em grande para a minha primeira saída a sério.
Mas nada feito, apesar da minha insistência, apesar das
minhas juras. E fui mesmo obrigado a comprar no aeroporto, acompanhado por um
polícia, um bilhete de regresso a Lisboa, porque nem sequer aceitavam um para
França.
No aeroporto era esperado pelo André que não conhecia e que
fora indicado para meu tutor durante o estágio. E que ficou amigo para uma
vida. Sabia o meu voo, perguntou por mim pela instalação do aeroporto, mas não
dei por nada, embrulhado que estava naquela bem esquisita trapalhada.
Chegado ao hotel Bellaria, tinha uma mensagem. Dei-lhe
seguimento e, pouco tempo depois, estou em casa do André. Caras incrédulas face
ao que relatava.
A permanência de 15 dias permitiu-me defrontar outros
episódios da mesma natureza, de xenofobia, mas não no hotel, nem no local de
estágio.
Mas tudo se passou há 40 anos, há muito tempo. Mas se recordo
isto é porque houve um referendo na Suíça, com os resultados que se conhecem. As
coisas não mudaram muito no país das contas bancárias numeradas e que levou
Jean Ziegler a escrever o seu “A Suíça Lava Mais Branco”, em 1989.
E quase juro que a UE vai vergar-se ao poder que se esconde
atrás de tais contas, permitindo à Suíça escolher os tratados bilaterais que
lhe convém ter.
Veremos.
Este hotel já não existe, mas alguém vende este autocolante na net, onde encontrei a imagem.
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