“O que havia em ti que eu não encontrava noutras mulheres, o
que te singularizava no espaço reduzido da sala de aula?
Penso que para lá da atracção inicial, inteiramente física,
e do desejo de por minha vez te agradar, foi o lado mental e emocional que me
fez olhar para ti de outro modo. Descobri que eras sensual e brilhante e cedi
ao desejo de dialogar contigo. As palavras tiveram um papel decisivo no que se
passou entre nós. Eu procurava, a todos os níveis, uma interlocutora, percebi. Era
isso, finalmente, o que encontrara. Julgava conhecer as mulheres, mas percebi
que tinha aportado, contigo, a um outro continente.
[…]
“A nível colectivo, a recordação mais forte é a de uma crise
generalizada. Em 83 já tinha havido 10 eleições desde 74, havia greves,
salários em atraso, uma dívida externa gigantesca.
Lembro-me de começarem a demolir o Monumental, apesar dos
protestos e dos baixo-assinados, que também ajudámos a recolher.
Sim, lembro-me dos teatros, dos cinemas, dos cafés. Lembro-me
de termos visto Dreyer e Max Ophuls na Cinemateca, Mariana Espera Casamento na
Cornucópia, Uma Comédia Sexual Numa Noite de Verão de Woody Allen, de Fanny e
Alexandre de Bergman.”
[…]
“Na Assembleia da República, para negociar medidas de
combate à corrupção, por duas vezes faltou o quórum.
A seguir os impostos aumentaram, houve novas greves, a dívida
externa cresceu seiscentos milhões de dólares num semestre.
O FMI interveio, para evitar o descalabro. Mas obviamente
nada fez para resolver os problemas estruturais do país.”
[…]
Comove esta serena melancolia que vai por esta “Cidade de Ulisses”,
considerada uma história de amor por Lisboa. Cidade que sempre mexeu
obrigando-nos a estar vivos, sempre vivos. O livro é um convite a uma viagem
que vale a pena, ao lado de um par que vive intensamente uma relação de amor.
Sem comentários:
Enviar um comentário