quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Lendo "Alfabetos" de Magris


“Kafka dizia que um livro deve atingir-nos como um soco, abalar com violência o leitor e a sua habitual visão das coisas. Receber um soco não é agradável; segundo Kafka, uma autêntica literatura deve pois conter – além do jogo, do prazer, do sabor do mundo e da sua reinvenção – também um certo desagrado, algo de chocante que desconcerta e cria mal-estar.
Poucos livros conseguem lidar com esse lado desagradável, por vezes insuportável, da vida que é uma sua verdade e não pode ser iludida ou atenuada. São esses livros que obrigam o leitor a atravessar os desertos da existência, sem levá-lo pela mão e sem ajudá-lo a esquivar-se às areias movediças – como faz a literatura bem-intencionada e tranquilizadora -, mas obrigando-o a refazer o mesmo caminho do escritor e a atolar-se na angústia e no lodo desse caminho, em vez de  lhe oferecer uma varanda panorâmica da qual ele possa tranquilamente admirar os infernos e os abismos sem se sentir ameaçado ou sorvido no remoinho.”
Claudio Magris, in “Alfabetos”

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